terça-feira, 19 de abril de 2011

DISCUSSÃO SOBRE A HISTORIOGRAFIA PIAUIENSE

E AS ABORDAGENS PARA A ESCRITA DE UMA HISTORIA INDIGENA NO PIAUI

Antonia Claudia de C. Rocha
Nilvon Batista Brito *

        Na historiografia piauiense  podemos encontrar diversas abordagens sobre a historia indígena dentre elas destacaremos a visão de aulguns autores como Joina Borges que defende a tese da ocupação do Piauí pelos povos tremembes teria se dado pelo litoral, enquanto João Renor atesta para o processo de resistência indígena  no período colonial diante das guerras empreendidas pelos colonizadores e  na abordagem  da professora doutora Claudete Dias o processo de povoamento do território piauiense causou despovoamento   das populações nativas (indígenas).


.     Na analise sobre a história dos primeiros habitantes do Piauí Borges (2004) afirma ser necessário olhar a história por outro viés que não o da história tradicional, essa enxerga o povoamento das Américas sobre a perspectiva do colonizador, que expele o  índio para fora da narrativa. O  próprio termo pré-história, inventado para designar o período anterior a invenção da escrita, período considerado  de barbárie, é um termo, segundo a autora, discriminatório que confirma a exclusão do índio como sujeito histórico. Para a autora o entendimento do processo de povoação do Piauí só seria possível em sua plenitude a partir do entendimento de um novo conceito de historia superando uma concepção de historia positivista onde a verdade dos fatos por meios incondicionais de documentos escritos faz crer que a historia é uma ciência que estudo essencialmente o passado.   Para a construção da narrativa de uma historia sem exclusão, autora afirma ser necessário desconstruir esse termo preconceituoso. Para a construção da narrativa dos primeiros povos que habitaram o Piauí a autora se apoiará no entendimento de  Marc Bloch sobre a história: “a história é a ciência do homem no tempo” e não do homem que tem escrita. Dentro dessa perspectiva da nova história  todos os vestígios do homem no tempo são considerados um documento: pinturas rupestres; restos de alimentos, de cerâmica, de habitação,corpos, etc.A polarização do tempo, onde de um lado estar o homem que não tem escrita  e do outro o homem com escrita  vai legitimar a conquista e domínio dos povos ditos “primitivos”, pois  o outro sem escrita é interpretado como se a sua memória necessitasse de uma decifração, algo que tornasse inteligível ao portador da verdade.
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Acadêmicos do 8º Período do curso de historia da UFPI-PI

O conhecimento histórico ao longo do tempo se deu por meio da observação dos sinais materiais da vida do homem nas suas atividades em busca da sobrevivência, quer seja o conhecimento do senso comum como também no campo da ciência o distanciamento da cultura popular, ligado a tradição oral e indiciaria, da cultura mais abastadas acontece no momento em que a segunda classe busca diferenciar-se para conseguir privilégios em relação a primeira. A metodologia, baseada na objetividade e neutralidade provinda da verdade que vem dos documentos escritos é o que estabelecerá a diferença.  Assim a historia ao abandonar a busca   do saber  pelos métodos investigativos por meios de vestígios se entrega a cientificidade dos documentos científicos para se igualar as demais ciências naturais se distancia do seu objeto principal: o homem que “ama,sente,deseja,ou seja,vive,para se ocupar do homem  racional, que produz eventos no tempo.”
Para o historiador e a produção histórica, sobre um outro aspecto que não o da historia tradicional,  é necessário ter imaginação para ler os fragmentos deixados pelo homem em “paredes de pedras, em pirâmides,em sítios arqueológicos, nesses locais estão grafados a vida do homem em todos os seus aspectos racional e sentimental ler esses vestígios, que se constituem documentos, é fazer história.
            Dentro desse entendimento, um sitio arqueológico constitui um local repleto de indícios para o fazer historiográfico de acordo com a Nova Historia. O sitio seu bode no litoral piauiense estão expostos  vestígios da vivencia dos primeiros habitantes do litoral piauiense cabe ao historiador observar,analisar e decifrar o emaranhado de fragmentos ali expostos. Pois ali estão os sinais da existência do homem e para a história interessa a vida do homem em qualquer estado de existência.
          De acordo com  a observação de Borges a historia do povoamento da America aparece sempre nos livros didáticos e nas disciplinas das universidades como um apêndice preliminar , sempre fazendo parte de um período chamado de pré-história. Discute-se como o continente foi povoado, como chegou até aqui os primeiros povos etc. no entanto no momento em que entra em cena o colonizador a historia dos americanos  perde seu foco. Os mitos americanos não têm lugar nos livros escolares em seu lugar os mitos europeus ocupam todo o espaço. Mesmo reconhecendo que a colonização prejudicava os povos americanos os livros colocam como um mal necessário.
            Quando e por onde chegaram os povoadores da América é ainda incerto, apesar de várias teorias discutirem o assunto. Sabe-se que o homo sapiens saiu de seu berço na áfrica para povoar o mundo. Esses povos viviam  da caça, coleta de vegetais e pesca o que lhes permitiam sobreviver em meios hostis e possibilitava a aventura do deslocamento sem a preocupação da alimentação, dessa maneira foram se movimentando em direção ao sul provavelmente fugindo do frio durante a era glacial em busca de ambientes mais quentes. Talvez se os mitos dos povos americanos não tivessem sidos silenciados em detrimento dos mitos europeus fosse mais fácil a compreensão da diáspora do homo sapiens.
            As várias teorias sobre a penetração do homem no continente americano não dão conta de explicar com precisão quando nem como se deu essa penetração. Algumas falam que se deu pelo mar enquanto outros que se deu por terra. Para Niède Guidon esse processo se deu de forma lenta e gradual  por diversas vias, contradizendo a teoria que aponta o estreito de Bering como local de penetração do homem no continente americano. O indicio da teoria de Guidon são os vestígios encontrados na Serra da Capivara em São Raimundo Nonato: fragmentos de uma fogueira datada de mais de 50 mil anos e os parasitos intestinais encontrados em fezes humanas fossilizadas datada de 7 mil anos de idade o que torna a exclusividade da via de Bering impossível já que os parasitos não suportariam as temperaturas geladas da Sibéria e do Alasca.
No entendimento de Borges é possível que o litoral do Piauí tenha sido uma porta de entrada dos primeiros povoadores da America do sul, embora não exista evidencia para essa hipótese. No entanto no litoral do Piauí foram encontrados vários sítios arqueológicos com inúmeros vestígios na superfície das praias e próximos as dunas. Segundo a autora o entendimento da ocupação humana no Piauí passa por esses sítios. As grandes perguntas são: por onde, quando e quantos chegaram e as respostas  estão nas marcas que deixaram nas paredes de pedras e dos vestígios materiais encontrados no solo.
            As tribos que constituíam a nação tremembé habitavam a costa norte do Brasil e mantinham uma relação ora amistosa ora em guerra com os portugueses. Conforme Borges não entender essa relação de parceria entre portugueses e índios é vê-los como coitados enganados (vitimas) pelos colonizadores, dessa forma, os índios deixam de ser sujeitos históricos. A alternância de ânimos entre índios e brancos vai indicar que essa relação atendia a interesses mútuos, assim o índio também faz história, impondo seus interesses dentro da dialética do comércio. O interesse do índio não é analisado dentro da historiografia, pois o mesmo não está no epicentro da colonização. Da mesma forma, a ocupação do interior do Piauí por parte dos brancos, é visto pela historiografia tradicional como parte do processo de expansão da pecuária, qualquer incursão ou mesmo habitação antes desse período tem um significado nulo no processo histórico de povoamento do Piauí.
            A pergunta que a autora faz é se esse significado também é nulo pra os Tremembés. Os habitantes do Seu Bode ficaram tranqüilos com as visitas dos brancos que aconteciam periodicamente naquele litoral?
            O ponto de partida da pesquisa de Borges para responder essa e outras perguntas que envolvem o assunto não é o ontem e sim o hoje “o que ele interfere na percepção do ontem [...]”, para isso a pesquisadora vai observar o sitio seu bode e realizar uma descrição densa do ambiente e dos objetos encontrados no local.
            Um dos aspectos analisado é a presença constante de moluscos em todo o sitio provavelmente resultado da atividade alimentar dos grupos que ali residiram. Contudo, a autora observa, existe uma limitação do lugar atual pelo fato do mesmo estar bastante modificado o que impede uma maior compreensão do espaço do passado, agravado pela falta de documento. O que deixa a narrativa do cotidiano dos povos primeiros muda, embora Se possam vislumbrar ecos do cotidiano de um povoamento Tremembé no sitio Seu Bode. A hipótese da autora é apoiada na comparação de objetos confirmadamente Tremembé com os artefatos cerâmicos encontrados no sitio Seu Bode.
         
               Em relação ao  estudo de João Renor de Carvalho, denominado “Resistência indígena no Piauí 1718-1774”, a discussão é  sobre as origens e a trajetória de resistência das nações indígenas no Piauí, desde a chegada dos imigrantes tupis trazidos pelos fenícios até o início da colonização territorial. Dentro deste contexto e procurando apresentar as diferentes visões sobre os primitivos habitantes do Piauí, João Renor busca embasamento na tese de Ludovico Schwennhagen, filólogo alemão que aponta para a existência de um império colonial fenício no nordeste do Brasil, tendo Piracuruca como centro administrativo deste império e Sete cidades como um centro nacional, político e religioso de uma confederação de povos tupis, totalizando sete povos, sob domínio dos fenícios.
              Já na visão de arqueólogos como Paul Thiry e Philippe Aziz, apresentados no texto de João Renor (2008, p.24) “corroboram a tese de que os primitivos habitantes do Brasil fundiram-se com imigrantes procedentes de povos mediterrâneos em épocas muito remotas”. Considerando as informações apresentadas, Renor destaca o século XVIII e o período de governo do capitão-general João da Maya Gama, como o foco do seu estudo que segundo o autor, compreende o período em que o Piauí esteve sob a administração dos governadores do Maranhão e posterior jurisdição. Ressaltando o governo de Maya da Gama como representante da transição histórica da solução de conflitos com os indígenas do Maranhão, do Pará e do Piauí, embora conforme o autor “os problemas sofreram uma interrupção temporária e persistem até hoje.” (CARVALHO,2008 p.26)
           De acordo com a pesquisa em documentos arquivísticos, João Renor analisa alguns acontecimentos que estão na origem dos conflitos entre comunidades de origem européia e seus descendentes ou prepostos e as comunidades nativas que secularmente  ocupavam a região , que se tornou Capitania Colonial do Piauí durante a vigência do domínio português no Brasil.Um desses acontecimentos foi a determinação do Rei em 13 de março de 1702, que passava as fazendas de gado  e os moradores da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória do Piauí para serem vinculados ao governo do Estado do Maranhão, desvinculando essa área da Capitania. 
Atestado para o interesse que a coroa
             
              Na abordagem da Pofª Drª. Claudete Maria Miranda Dias, a historiografia tradicional mostra o Piauí como um espaço que foi descoberto, desbravado e conquistado pelos colonizadores, uma versão que privilegia a visão do colonizador europeu. De acordo com a autora, deve-se considerar a visão do nativo, pois com base em dados da pré-história, o Piauí já era povoado antes da chegada dos supostos “colonizadores”. Contudo, o que os colonizadores chamavam de povoamento, pode ser entendido como despovoamento das populações nativas, uma vez que o processo de ocupação das terras piauienses teve como foco a destruição dos povos indígenas, população esta que já ocupava o solo piauiense antes dos bandeirantes /desbravadores chegarem.
             Diante disso, o processo de conquista /ocupação das terras do Piauí gerou dentre outros conflitos, a luta pelo domínio da Terra. Para os nativos o espaço estava sendo invadido e era preciso defendê-lo, para os colonizadores era a descoberta de novas terras que deveriam ser conquistadas e ocupadas. Tal conflito dizimou grande parte da população nativa.
        Concluímos portanto que os autores em debate tem alem da temática comum (historia indígena), opiniões  que se relacionam intimamente, como a defesa do ponto de vista do indígena feita por Joina e Claudete dentro do processo de escrita da historia. Enquanto Renôr ressalta que apesar dos processo de luta empreendido contra os indígenas é importante entendermos que houve um processo de resistência desses povos diante desses conflitos possibilitando o estudo desses grupos nos dias atuais. 

Referencias:
BORGES, Joína. A Historia Negada: em Busca de Novos Caminhos.Teresina: FUNDAPI,2004

CARVALHO,João Renôr F. de. Resistência Indígena no Piauí Colonial. Imperatriz,MA: gráfica Brasil,2008

DIAS, Claudete Maria Miranda.




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